"Quem és tu que me lês? És o meu segredo ou serei o teu?"
Clarice Lispector



quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Indiferença ou sabedoria?



Indiferença ou sabedoria?

 Danusa Leão 





      Se alguém perguntar se sua vida foi, até agora, um sucesso ou um fracasso, o que você vai responder?
Detalhe: se foi destaque da escola de samba na avenida e levantou a arquibancada, fique logo sabendo que não tem nada a ver.
Aliás, dinheiro não tem nada a ver, ser deslumbrante também não, ter aparecido em várias capas de revista também não.
Então, o que é ter tido uma vida de sucessos?
Bem, depende.
      Todos nós já ouvimos da boca de uma mulher muito modesta a frase:
 “Criei meus filhos, estão todos encaminhados; posso me considerar muito feliz e realizada”.
 E quem nunca ouviu pessoas que aparentemente têm tudo – por “tudo” entenda-se família, saúde, dinheiro, amor, mesmo que não seja verdadeiro e não necessariamente nessa ordem – se queixando e tentando, inutilmente, entender o significado da vida?
     Temos, quase todos, razões para achar que nossa vida foi gloriosa ou um vale de lágrimas.
 Você, por exemplo, já deve ter passado por ótimos e por péssimos momentos. Quais ficaram no seu coração? Os melhores ou os piores?
 Difícil avaliar.
 Às vezes, a gente se acha uma pessoa privilegiada; outras vezes, uma coitada, dependendo do que mais valoriza naquele momento – pois, conforme a hora, os valores também mudam.
Ou será que você se considera uma pessoa coerente?
    Houve um tempo em que seus sonhos se resumiam a passar a vida viajando pelo mundo em jatinhos, comprando tudo o que visse, num turbilhão que não deixasse tempo nem para pensar; isso, sim, seria a felicidade – só que não foi. Depois, tudo o que quis foi encontrar um bom marido, mesmo meio sem graça, que tivesse hora certa para chegar em casa, com um bando de crianças perturbando em volta, para não ter tempo de pensar se era feliz ou infeliz.
Isso. sim, seria a felicidade – só que “também não foi.
       Aí, achou que o importante seria a realização pessoal, independentemente de um homem.
Também não foi, mas conseguiu o que parecia impossível; viver sem estar permanentemente apaixonada, ou melhor, sem inventar que estava apaixonada.
      Hoje, se alguém perguntasse se sua vida foi – até agora – um sucesso ou um fracasso você não seria capaz de responder. Foram tantos bons momentos, e tão felizes, que prefere não lembrar.
Quanto aos maus momentos, foram também tantos, e tão terríveis, que faz tudo para também não lembrar – e às vezes até consegue.
    Agora, já sabe; às vezes, você acorda feliz – sem nem saber por quê -, sai de casa, na primeira esquina tropeça e fica no pior humor da vida.
Já dia seguinte, acorda péssima, o telefone toca alguém de quem você gosta, e a vida se toma, de repente, boa de ser vivida.
É essa certeza de tudo pode mudar em minutos, segundos, que nos ajudam a segurar a onda quando tudo fica difícil.
Se as coisas estiverem indo mal, pense em quantas outras ocasiões elas estiveram tão mal quanto, ou até pior, e tudo passou.
 Não, não reclame, não chore, não se descabele, apenas espere;  se possível, com aquela quase indiferença que já viu tantas vezes nos olhos dos mais velhos, que sabiam que ia passar – porque sempre passa.
Essa indiferença pode ser chamada de sabedoria ou experiência, o que, no fundo, é mais menos a mesma coisa.

(Texto extraído da revista Claudia / Julho 2012)